A Câmara Municipal de Jaraguá do Sul realizou, na noite de terça-feira (22), a terceira e última audiência pública para debater a situação da população em vulnerabilidade social no município. O encontro, realizado no auditório do Centro Empresarial (CEJAS), focou na construção de propostas e encaminhamentos para o aperfeiçoamento das políticas públicas assistenciais, reunindo representantes dos poderes Executivo e Legislativo, entidades da sociedade civil e a comunidade.
A audiência foi marcada pela apresentação de ações em andamento pelas secretarias de Assistência Social e Saúde, sugestões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e, principalmente, por falas contundentes de profissionais da linha de frente e cidadãos que cobraram mais efetividade, humanidade e a criação de políticas de longo prazo.
Propostas do Executivo
A secretária de Assistência Social e Habitação, Bianca Uber, destacou o trabalho integrado com a rede de saúde e segurança e citou propostas previstas no Plano Plurianual (PPA), como a criação de um Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) e a construção de uma sede própria para a Casa de Passagem. “As duas propostas são essas. E o que a gente tem em andamento e concluído agora nesse momento é o decreto aprovado”, afirmou, referindo-se à regulamentação da lei que trata, entre outros pontos, da internação involuntária.
O Decreto nº 19.486/2025, que regulamenta a Lei Municipal nº 9.609/2024, será responsável por estabelecer diretrizes para a internação humanizada, inclusive de forma involuntária, de pessoas com dependência química e/ou transtornos mentais. O ato normativo é um passo para a atuação mais integrada entre as secretarias municipais e forças de segurança, com foco na abordagem qualificada e no encaminhamento de pessoas em situação de rua.
O secretário de Saúde, Rogério Luiz da Silva, por sua vez, apresentou dados do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS AD), que atualmente acompanha 143 pacientes, dos quais 27 são pessoas em situação de rua. Entre os projetos, o secretário destacou o plano de mudança do CAPS AD para uma casa própria na Vila Lenzi, uma licitação em andamento para credenciamento de 45 leitos de internação psiquiátrica (com um orçamento provisionado de R$ 4,8 milhões), e a meta de médio prazo de construir um CAPS 3 e implementar o consultório de rua. Como exemplo de sucesso, citou o caso de um cidadão que, após passar pelo CAPS, está há quatro meses sóbrio em uma comunidade terapêutica. Em contrapartida, revelou que dois casos graves já estão sendo encaminhados ao Ministério Público e devem ser os primeiros a passar por internação compulsória sob a nova legislação.
Rogério Silva, Secretário da Saúde
Leandro Miotto, Vereador
Sugestões da OAB e manifestações
Representando a OAB, que provocou a realização das audiências, o presidente da subseção de Jaraguá do Sul, o advogado Eduardo Follmann, apresentou uma série de sugestões. Entre elas, a criação de um sistema municipal de registro integrado, a busca por cofinanciamento federal para o Centro POP, a intensificação de programas de moradia como o aluguel social, e o aumento do repasse de verbas para a assistência social. “A ideia de convocação desta audiência pública, de forma alguma, foi fazer pressão ao Executivo para que aprovasse então um decreto de internação humanizada”, esclareceu.
Outras falas vieram da plateia. Profissionais que atuam diretamente com a população vulnerável e cidadãos engajados criticaram a visão de que a internação compulsória seja a principal solução. “É possível cuidar de alguém sem escutá-lo? Internar compulsoriamente pode parecer uma solução rápida, mas é só uma forma de afastar os pobres dos olhos da cidade”.
Niura De Marchi, advogada
Sérgio Homerish, CDH
Rosete Schumacher, profissional da saúde, e Rita Mello, técnica de enfermagem do CAPS AD, trouxeram relatos e críticas sobre a realidade do atendimento. Rita apresentou um caso de exemplo de recuperação de uma pessoa que demandou mais de dois anos de acompanhamento contínuo, evidenciando que a internação por si só não resolve. “A gente não tem o depois. A gente não tem políticas públicas em Jaraguá que trate desse assunto”, desabafou Rita, que também revelou a falta de abertura das escolas municipais para palestras de prevenção sobre drogas.
Encaminhamentos da Câmara
Ao final da audiência, o presidente da Câmara, vereador Almeida (MDB), anunciou os encaminhamentos. Os compromissos serão esses:
Criação de uma Comissão Especial Permanente: Para acompanhar de forma contínua as políticas públicas para a população vulnerável, com a participação de vereadores e representantes da sociedade civil e das secretarias.
Publicação dos Anais: Todas as falas das três audiências serão transcritas e compiladas em um livro, para eternizar o debate e servir como documento de consulta.
Formalização das Propostas: Um documento oficial, contendo todas as sugestões apresentadas pela OAB, pelos profissionais e pela comunidade, será elaborado e direcionado ao Poder Executivo.
Ação sobre a Prevenção nas Escolas: O presidente se comprometeu a requisitar formalmente à secretária de Educação, Iraci Müller, que reverta a situação e abra as portas das escolas municipais para as palestras preventivas do CAPS AD. “Que absurdo. Vergonhoso”, declarou.
“Eu vejo que nós temos que trabalhar o antes de se chegar neste ponto [da internação], com todas as ações inerentes a políticas públicas possíveis, porque isso não é gasto, isso é investimento”, declarou Almeida, que se comprometeu a cobrar da Secretaria de Educação a abertura para as palestras de prevenção. Para ele, ficou a sensação de que, embora o diagnóstico seja complexo e as soluções desafiadoras, o diálogo foi um passo essencial para transformar as intenções em ações concretas e duradouras em Jaraguá do Sul.
